As cabeças rolarão, não haverá piedade, clemência ou salvação. Contato e envio de textos: cabecascortadas@gmail.com

O beijo.

As mãos de F. navegam calmamente sobre aquele mar de cabelos ondulados, onde a maciez daqueles fios ruivos trazia-lhe uma sensação de calma e conforto. Os dedos deslizaram por todo o pescoço de Helena. Trêmula, a mulher sentia aquelas mãos tocarem suas costas nuas e as unhas cravadas em sua pele trazer-lhe um estranho prazer misturado com dor. Ela curvava-se cada vez mais sobre a cama, empurrada pelo corpo de F. que estremecia a cada movimento. O corpo dela fora finalmente tombado sobre o leito, caída sobre o lençol branco como uma sereia à luz do luar. Os cabelos afogueados, espalhados sobre o colchão, os olhos cor de esmeralda fitando F. tão profundamente, que ele teve a sensação de ter a alma bisbilhotada.
Ele virou o corpo de Helena com cuidado, ajoelhou-se sobre o chão, tendo os olhos alinhados aos joelhos dela. Colocou as mãos sobre as coxas da mulher, acariciando cada centímetro de pele macia, sentindo os pêlos e suor arrepiar seu próprio corpo. As mãos dela agarraram as suas, puxando-o para mais perto de si. Ainda de joelhos, ele encostou a cabeça sobre as coxas de Helena, podia sentir aquele cheiro de mulher exalado de cada poro, podia encostar sua boca no ventre dela, sentir e ouvir sua respiração ofegante, beijar aqueles pêlos e aquele suor que tanto o faziam estremecer. Tirou os joelhos do chão, F. ia erguendo o corpo lentamente, explorando cada espaço da pele de Helena que seus lábios podiam conhecer, sentindo seu cheiro e seu gosto salgado, gosto que somente as sereias têm.
Quando o corpo do homem deitou-se sobre o de Helena, ela teve uma forte vontade de mordê-lo, mastigar sua carne e beber do suor que escorria-lhe pela face rubra. Enquanto ele beijava seu pescoço, a mulher cravava suas unhas nas costas de F., que gemia, suspirando profundamente, sem descolar os lábios da pele de Helena. A boca dele aproximava-se cada vez mais dos lábios secos dela. Lábios que pareciam duas faixas estreitas de um deserto inóspito. F. agarrou com força os cabelos da mulher, e abrindo-lhe as pernas, curvou-se sobre seus seios, semelhantes a um par de luas cheias. Lambeu-lhe os mamilos, como uma criança faminta nos braços da mãe, à procura do leite. Helena sussurrara gemidos ao pé do ouvido do homem, que a beijava ardentemente, como se aquele fosse o último dia de sua vida.
Seus beijos foram transportados para o rosto da mulher. As bochechas rosadas roçavam sobre os lábios de F., afogado em um profundo delírio. Ela contorcia-se freneticamente como se habitada por espíritos, os membros queriam se afundar na pele de F., transpassar sua carne, seus olhos, seus órgãos, sua alma. O homem então a beijou; beijou como um tornado devastando uma cidade, uma labareda a queimar a pele de uma bruxa. Ela sentia seu corpo estremecer, podia sentir o suor escorrer paulatinamente por todo seu pescoço até cair no lençol branco. Enfim, tirou uma de suas mãos das costas de F., introduzindo-a sorrateiramente por debaixo dos travesseiros.
O homem tirou seus lábios da boca dela, olhando para trás. Com um grito rouco, ele ergueu o tronco, e apenas teve tempo de agarrar-se aos cabelos ruivos e cacheados de Helena, e olhar profundamente para seus olhos verdes. O corpo de F. finalmente caíra sobre o da mulher, imóvel, a respiração lenta, lenta, até não existir mais. Helena não conseguia mais sentir o sangue correr pelas veias do homem, nem ouvir seu coração bater com força, quase que com desespero. Ela apenas ouvia, agora, um silêncio aterrador. O vento havia se calado. Ela retirou das costas dele a faca, permanecendo sentada sobre a beira da cama. Percebeu que os lençóis não eram mais brancos. Eram agora vermelhos.

Leandro escreve:
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