As cabeças rolarão, não haverá piedade, clemência ou salvação. Contato e envio de textos: cabecascortadas@gmail.com

Muralha solidão.

Nesse lugar tem cheiro de umidade e mofo.
As grades na janela sem vidro me dão uma sensação gélida.
Os fios de luz no teto estão arrebentados e muitos deles me incomodam quando fico em pé, e quando estou sentado me mostram uma decoração decadente.
Vejo os tristes passando, e as paredes quase demolidas.
As arestas de sol adentram más, aborrecem e dão desconfiança.
Essa latrina é um espelho para o fim e a desistência.
Onde qualquer esperança se esvai.
As baratas vêm aos milhares.
Elas invadem tudo, por que bem como chegam nadando saem correndo e batem asas.
As migalhas e o ácaro daqui são um agrado para as visitantes.
Deixo os farelos por que preciso de companhia.
E a poeira é um presente do tempo.
A minha paciência cresce todos os dias.
Contar baratas é uma diversão.
É como uma ampulheta dia e noite.
O pior é durante o escuro.
A noite passada um rato devorou o meu pacote de bolachas que estava sobre a mureta da janela.
Um presente cheio de insônia.
Eu dormia quando acordei com os barulhos.
Pesava uns quatro quilos, o rabo era mais grosso que meu anular.
Os dentes dele faziam uma ópera que me assustava.
Parecia que era a engrenagem de um carrossel bandido que atritava o silêncio.
É um pânico, olho aberto, é pulmão cheio e mão suja.
Um sinônimo para favores.
O cigarro é moeda para tudo e abre mais portas que as chaves.
É uma paranóia.
A fumaça faz o papel de esposa.
Fumar é como abreviar o tempo, como dar corda num brinquedo.
Aqui a gente busca inspiração em coisas que nunca me tocaram.
E pensar que a água gelada que usamos no banho me mantêm acordado para assistir essa mesma televisão interna todos os dias até tarde da noite.
Dormir quase não é.
É por isso que anoto muito que encontro aqui.
As coisas são de um jeito Sansão.
Tudo me parece um beijo que entrega para a morte e o esquecimento.
O sangue que mancha o chão do pátio e das passarinheiras é sempre ajuste de contas.
A condenação não é problema, porque estamos cercados pelo concreto e a véspera sem fim.
E de tudo que há aqui, o que mais me enfeitiça é o vento.
Bate tanto os corredores que se torna descomunal.
Esse tempo frio é intrigante, por que me mostra que estou no lugar mais aberto e mais fechado que existe.
Contato com o autor: afoborio@gmail.com